Biblioteca (gr. Βιβλιοθήκη),
obra atribuída pelos antigos a Apolodoro
, é um
dos mais importantes instrumentos para o estudo sistemático da mitologia grega.
Edição bilíngue de [Apolodoro]
Seu autor, que certamente não tinha pretensões literárias, compilou diligentemente todos
os mitos gregos conhecidos e organizou-os em genealogias, fazendo em prosa o mesmo que Hesíodo e o poeta do
Catálogo das Mulheres fizeram em versos.
Autor e data
A atribuição do texto ao gramático e erudito Apolodoro (gr. Ἀπολλόδωρος),
que viveu em Atenas no século -II, não se sustenta; consequentemente,
o correto é referir-se ao autor da obra como
“Pseudo-Apolodoro” ou como [Apolodoro].
O primeiro a citar a Biblioteca foi o patriarca bizantino Fócio, que viveu
no século IX, mas há evidências de que trechos da obra foram utilizados por Zenóbio,
na época do Imperador Adriano (117/138). É provável, pelo estilo e por
outras evidências internas, que o autor da Biblioteca tenha criado sua obra
nos séculos I ou II de nossa Era.
Fontes
[Apolodoro] seguiu de perto as melhores fontes literárias disponíveis e teve o
cuidado de assinalar, quando necessário, as controvérsias entre elas. Eis um exemplo
típico (Apollod. 3.8.2):
Εὔμηλος δὲ καί
τινες ἕτεροι
λέγουσι
Λυκάονι καὶ
θυγατέρα
Καλλιστὼ
γενέσθαι:
Ἡσίοδος μὲν
γὰρ αὐτὴν μίαν
εἶναι τῶν
νυμφῶν λέγει,
Ἄσιος δὲ
Νυκτέως,
Φερεκύδης δὲ
Κητέως.
Eumelo e alguns outros dizem que Licáon teve também uma filha, Calisto.
Hesíodo diz que ela era uma das ninfas; Ásio, (filha) de Nicteu; e
Ferécides, de Ceteu.
Muitas fontes, como Homero, Hesíodo e os poetas trágicos são bem conhecidas; de
algumas, como Ferécides de Leros (-500/-450), Acusilau de Argos
(c. -500) e Asclepíades de Trágilo (sæc. -IV),
temos fragmentos razoáveis. Do anônimo Catálogo das Mulheres (c.
-550), em cujo plano expositivo a Biblioteca aparentemente se
baseia, também temos numerosos fragmentos; mas das obras de Êumelo e Ásio, por
exemplo, não temos praticamente nada.
Resumo do texto
O texto é bastante longo e ocupa pouco mais de 350 páginas (distribuídas em dois
volumes) na edição de Frazer (1921), na qual se baseia este resumo.
As lendas são tratadas de forma muito sumária, resumida mesmo, porém completa.
Distribuem-se ao longo de três livros e terminam um tanto abruptamente
no final do Livro III. Uma “epítome” independente dos manuscritos que contêm os
livros, descoberta há algumas décadas, felizmente continua a partir do ponto
interrompido.
Livros I e II
Descendentes de Urano e Gaia: os titãs, Crono, os deuses olímpicos (1,
1-6). Prometeu e a criação da humanidade, Deucalião e Pirra, os
descendentes de Éolo, os Argonautas (1, 7-9). A família de Ínaco:
Faroneu, Dânao, Acrísio e Preto, Perseu, Anfitrião, Héracles e suas façanhas (2,
1-8).
Livro III
A família de Agenor: Europa, Cadmo, Édipo, os Sete Contra Tebas, os
Epígonos (3, 1-8). A família de Pelasgo: Licáon, Calisto, Auge e
Atalanta. (3, 8-9). A família de Atlas: Idas e Linceu, Castor e
Polideuces, Asclépio, Laomedonte, Títono (3, 10-12). A família de
Asopo: Egina, Éaco, Peleu, Télamon (3, 12-13). Os reis de Atenas:
Cécrops, Céfalo, Egeu, Teseu (3, 14-16).
Epítome
Os reis de Atenas (cont., Ep. 1). A família de Pélops (Ep. 2). A
guerra de Troia: prelúdio, expedições (Ep. 3), a ira de Aquiles (Ep.
4), últimas lutas, o cavalo de Troia e a queda da cidade (Ep. 5). O retorno
dos heróis, as aventuras de Orestes (Ep. 6) e de Odisseu (Ep. 7).
Segundo Frazier (1921), Apolodoro nos conduz desde as eras puramente míticas,
situadas bem além da memória humana, até as fronteiras da história
.
Manuscritos, edições e traduções
Os manuscritos mais importantes para os primeiros livros são o Parisinus
2722, do século XIV, da Biblioteca Nacional de Paris e o Laudianus 55, do século XV,
da Biblioteca Bodleiana de Oxford; para o final do Livro 3 e a Epítome, o melhor é
Vaticanus 950, do fim do século XIV, da Biblioteca do Vaticano (Roma). O
Vaticanus 950 foi escrito, aparentemente, pelo erudito bizantino Johann
Tzetzes (sæc. XII).
A primeira edição moderna (editio princeps) foi a de Benedictus Aegius em 1553. As edições básicas
são as de Heyne (1782-1783), a de Westermann (1843) e a de Wagner
(1894), esta a mais completa. A mais acessível e importante, porém, é a de Frazier
(1921), utilizada aqui, notável pelas notas abundantes, comentários e
referências.
Passagens selecionadas
Em português, dispomos apenas de duas traduções não publicadas, as de Luiz Alberto Machado Cabral (2013),
e a de Caio Vieira Reis de Camargo (2016). Ambas estão, no entanto, disponíveis on line.