Eurípides / Alceste

Ἄλκηστις Alcestis E. Alc. -438
Héracles, Alceste e AdmetoHéracles, Alceste e Admeto

A tragédia Alceste (Ἄλκηστις) é, a um tempo, o mais antigo drama de Eurípides que sobreviveu e o único anterior à Guerra do Peloponeso.

A distância entre Alceste e As filhas de Pélias, sua primeira tragédia, é de quase 20 anos; trata-se, indubitavelmente, da obra de um poeta experiente e maduro.

O drama tem 1163 versos e foi representado nas Dionísias Urbanas de Atenas em -438; era parte de uma tetralogia na qual ocupava o quarto lugar, habitualmente reservado aos dramas satíricos. As outras tragédias, nenhuma das quais chegou até nós de forma completa, eram Cretenses, Alcmeon em Psófis e Télefo. Eurípides foi classificado em segundo lugar e a vitória coube a Sófocles — mas não sabemos o nome de suas tragédias nesse concurso.

Até hoje há uma certa controvérsia quanto à exata natureza desta peça. Segundo alguns eruditos, pela posição na tetralogia, pelo “final feliz” e pelo tom levemente humorístico de algumas passagens, ela é mais condizente com um drama satírico ou com uma tragicomédia do que com uma tragédia. A maioria, no entanto, reconhece em Alceste uma verdadeira tragédia, pois esses mesmos elementos podem ser encontrados nas demais tragédias de Eurípides e, em menor grau, nas de Ésquilo e de Sófocles, e isso sem mencionar o fato de que o drama foi aceito pelo arconte no concurso de tragédias.

Hipótese / argumento

Alceste relata a lenda de Admeto, rei de Feras, o amigo de Apolo que escapou da morte graças à dedicação e sacrifício de sua esposa, Alceste, que se ofereceu para tomar seu lugar. Mas tudo acaba bem quando o poderoso Héracles, a caminho de seu 8º Trabalho, intervém e consegue trazer Alceste de volta, depois de lutar contra o próprio Tânato.

Dramatis personae

Apolo filho de Zeus e Letó, deus da adivinhação, da medicina e da música Tânato personificação da morte Coro anciãos de Feras Alceste filha de Pélias, esposa de Admeto e mãe de Êumelos Admeto esposo de Alceste, filho de Feres, pai de Êumelo, rei de Feras Êumelo filho de Admeto e Alceste Héracles filho de Zeus e Alcmena, herói e amigo de Admeto Feres pai de Admeto, antigo rei de Feras

E mais um servo e uma serva de Admeto.

Mise en Scène

A cena se passa em Feras, na Tessália, no palácio do rei Admeto. O protagonista fazia Apolo e Admeto; o deuteragonista, Alceste, Feres e Héracles; o tritagonista, Tânato e os servos.

Resumo

A tragédia contém 1163 versos, distribuídos em 48 páginas da edição de Méridier (1926), que serviu de base para o presente resumo.

Apolo explica ao público porque Alceste está morrendo e Tânato se prepara para vir buscar a rainha. Apolo tenta, em vão, dissuadí-lo, e prediz a chegada de Héracles (Prólogo, 1-76). Do lado de fora do palácio, o coro conjetura se Alceste ainda vive ou está morta, e lamenta que Asclépio já não esteja entre os vivos (Párodo, 77-131).

Uma serva sai do palácio, em lágrimas, e informa que sua ama está quase morrendo. Relata os preparativos e preces efetuados por ela pouco antes, o sofrimento de seus filhos e de Admeto (1º Episódio, 132-212). O coro implora aos deuses em favor de Alceste e Admeto (1º Estásimo, 213-237).

Alceste delira, nos braços de Admeto; depois, recuperada, transmite a ele seu último desejo: que ele não dê aos filhos uma madrasta. Admeto diz que guardará luto toda a vida, e pouco depois Alceste morre. Êumelo, um dos filhos pequenos, lamenta a perda da mãe e a seguir Admeto informa as disposições para o funeral (2º Episódio, 238-434). O coro canta os méritos da falecida Alceste (2º Estásimo, 435-475).

Héracles chega ao palácio, a caminho da Trácia, para realizar mais um de seus famosos Trabalhos. Admeto, embora enlutado, convence o herói a ficar em sua casa, alegando que o luto se devia apenas ao falecimento de uma mulher ligada à família (3º Episódio, 476-567). O coro celebra a generosa hospitalidade de Admeto (3º Estásimo, 568-605).

Admeto sai do palácio com o cortejo fúnebre. Feres, seu pai, aproxima-se para homenagear a morta. Admeto, furioso, reprova ao pai não ter se oferecido para morrer em lugar de Alceste; o velho retruca duramente e chama-o de covarde por ter permitido que uma mulher morresse em seu lugar.

Quando o cortejo afinal se afasta, em direção à tumba, um servidor aparece e relata o comportamento turbulento de Héracles. O herói aparece a seguir e convida o servidor a se alegrar também; ofendido, ele não resiste e conta-lhe tudo. O herói cai em si, e sai após anunciar que enfrentará Tânato até que ele desista de sua presa e, se necessário, descerá ao próprio Hades.

Admeto retorna e, juntamente com o coro, entoa um longo lamento (4º Episódio, 606-961). O coro aconselha Admeto a se resignar e elogia Alceste (4º Estásimo, 962-1005).

Héracles retorna em companhia de uma mulher, censura Admeto por tê-lo enganado e pede-lhe que abrigue a mulher até que retorne da Trácia. Admeto desculpa-se, e diz não estar em condições de recebê-la em seu enlutado palácio. Héracles lhe diz que acabará esquecendo a morta e tanto insiste que o convence. Quando o herói retira o véu que encobria a mulher, Admeto se assusta e se alegra, pois está comtemplando a própria esposa, que Héracles conseguira resgatar das mãos de Tânato (Êxodo, 1006-1163).

Passagens selecionadas

Manuscritos, edições e traduções

As fontes mais importantes da Alceste são os manuscritos Parisinus 2713 (sæc. XII), da Biblioteca Nacional de Paris, o Vaticanus 909 (sæc. XIII), da Biblioteca do Vaticano e o Laurentianus xxxi 10 (sæc. XIV) da Biblioteca Laurenciana de Florença.

A editio princeps é a de Janus Lascaris, publicada em Florença em 1496. As edições modernas básicas são as de Dindorf (1869), Nauck (1871), Murray (1909) e Méridier (1926). A edição de Diggle (1984) apresenta de forma minuciosa e completa o estado atual do texto; a mais recente e acessível, porém, é a de Kovacs (1995).

A primeira tradução para o português foi publicada em 1908 por João Cardoso de Meneses e Sousa, o Barão de Paranapiacaba. Seguiram-na as traduções de Frederico José Peirone (1961), Junito de Souza Brandão (1968) e, pouco depois, a de Manuel de Oliveira Pulquério & Maria Alice Nogueira Malça (1973); e Clara Crepaldi (2017).