Eurípides / Alceste 157-96
No trecho selecionado, parte do 1º Episódio, uma serva do palácio relata os últimos atos de Alceste.
A tradução é de Fernando Brandão dos Santos, professor de língua e literatura grega
da
SERVA
Que se admire ao ouvir o que ela fez no palácio!
Pois quando sentiu que o dia marcado
chegara, em água de rio banhou seu
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alvo corpo e pegando de um móvel da casa
um vestido e adorno, enfeitou-se,
e parando diante da Héstia orou:
"Senhora, eu vou para debaixo da terra,
ajoelhando-me pela última vez diante de ti; rogo
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por meus filhos que estarão órfãos; ao menino uma querida
esposa dê em casamento; à menina, um marido ne.
Que os filhos que gerei não pereçam
morrendo como eu antes do tempo, mas felizes
na terra paterna encham a vida de prazer."
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Aproximou-se de todos os altares, dos que há na casa
de Admeto, e coroou-os e orou,
cortando tufos novos de mirto,
sem choro, sem gemido, nem mudou
a natureza bela de sua cor pelo mal que se aproximava.
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E depois, tendo caído no quarto e no leito,
lá sim, chorou e diz isso:
"Ó leito, onde eu soltei as cintas
virginais por este homem, no lugar de quem agora morro,
adeus! Não te odeio. Destruiste-me somente
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a mim, pois temendo trair-te e também ao marido
estou morrendo. A ti uma outra mulher possuirá,
não mais sóbria, mas talvez mais venturosa."
Ajoelhando-se beija-o , e molha
o colchão com seus olhos repletos de lágrimas.
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Depois de ter chorado bastante, até saturar-se ,
afasta-se arrastando-se do leito,
e muitas vezes saindo, voltou ao quarto
e se lançou de novo no leito outras vezes.
E os filhos pendurados no manto da mãe,
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choravam. E ela tomando-os nos braços,
acariciava tanto um como o outro, já que estava morrendo.
Todos os servos da casa choravam
lamentando a senhora. Ela estendia
a mão direita a cada um, e não havia nenhum, mesmo relapso,
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a quem ela não falasse e se despedisse de novo.
Tais são as aflições da casa de Admeto.