Ésquilo / Persas

Πέρσαι Persae Aesch. Pers.-472
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A mais antiga das tragédias completas de Ésquilo e, portanto, a mais antiga tragédia da literatura ocidental. É relativamente curta: 1078 versos.

Sumário

Persas (gr. Πέρσαι) é a única tragédia grega completa cujo enredo se baseia em eventos históricos e não em episódios míticos; é, também, a única sem personagens gregos.

A tragédia foi representada pela primeira vez em -472, no concurso das Dionísias Urbanas de Atenas[1]. A tetralogia de Ésquilo, que recebeu o primeiro prêmio, era composta pelas tragédias Fineu, Persas e Glauco de Potnias, e pelo drama satírico Prometeu; apenas a tragédia Persas sobreviveu. A tetralogia não era interligada, mas alguns estudiosos sustentam que há temas comuns aos quatro dramas.

O corego designado pelo arconte foi o célebre estadista Péricles (-495/-429), na ocasião com apenas 22 anos (I.G. II2 2318).

Personagens do drama

miniaturaXerxes
  • Coro de anciãos
  • Rainha
  • Mensageiro
  • Espectro de Dario
  • Xerxes

O coro é formado pelos Fiéis, anciãos persas que velam pelo reino na ausência de Xerxes (Heródoto 1.108; Xenofonte, Anábase 1.5.15). Todos os manuscritos identificam a rainha como “Atossa”, a partir das informações de Heródoto (e.g. 3.88) e, talvez, de antigos escólios; mas o nome dela não é mencionado em nenhuma parte da tragédia. Dario é o rei persa Dario I, falecido em -486; e Xerxes (-519/-465) é o filho de Dario I e Atossa, que reinou de -486 a -465.

É provável que personagens mudos, no papel de atendentes, acompanhavam a rainha (CITA).

Argumento

miniaturaGregos vs. persas

Os Fiéis aguardam, ansiosos, notícias do rei Xerxes, que conduziu poderoso exército contra Atenas; a Rainha está ansiosa e preocupada. Chega a notícia da derrota das forças navais persas em Salamina, mas Xerxes sobrevive e retorna a Susa, devastado.

Mise-en-scène

A cena se passa em Susa, capital do Império Persa[2], no intervalo entre as batalhas de Salamina (29 de detembro de -480) e de Plateia (-479).

O cenário compreende, basicamente, a tumba de Dario I, perto do palácio real[3]. A alguma distância se via, talvez, assentos e uma estrutura (vv. 140-1) que representava a entrada desse palácio, mas a questão é ainda muito controversa (ver Hall 1996, ad loc.; Garvie 2009, p. xlvi-liii).

0108
Fig. 0108. Localização de Susa. Imagine-se Plateia e Salamina perto de Atenas.

O prólogo é apresentado por um coro de anciãos, mas a tragédia efetivamente começa por um canto coral (párodo) que, no entanto, funciona como um prólogo (cf. Suplicantes). A rainha entra em cena no v. 155 em uma carruagem (607-9), assim como Xerxes no v. 909.

Sem levar em conta o Coro, dois atores eram suficientes para todos os papéis. O protagonista provavelmente representava primeiro a Rainha e depois, Xerxes; o deuteragonista encarnava o Mensageiro, depois o espectro de Dario e, finalmente, Xerxes.

Os atores usavam, seguramente, trajes que recordavam à plateia grega o esplendor oriental. Xerxes, por outro lado, apresenta-se em farrapos (1017-30).

Resumo

1-154   párodo

1-64 canto anapéstico Em Susa, apreensivos, os Fiéis aguardam notícias do enorme exército que o rei persa, Xerxes, levara para a conquista da Grécia. Catálogo dos principais guerreiros persas e seus aliados.
65-139 estrofes, antístrofes e epodo O irresistível exército, dividido em forças terrestres e marítimas, atravessou o Helesponto[4] e avança; o coro se mostra um tanto pessimista e conta que saudosas esposas aguardam a volta dos guerreiros.
140-154 canto anapéstico O coro lembra ser necessário pensar se os persas ou os gregos estão vencendo. A rainha se aproxima.

155-531   1º episódio miniaturaO sonho de Atossa

155-248 a Rainha e o sonho premonitório 159- A Rainha, inquieta, relata sonhos preocupantes e maus presságios; é aconselhada a oferecer sacrifícios aos deuses e a invocar a proteção de seu falecido marido, o rei Dario.
249-531 o mensageiro e as más notícias

532-97   1º estásimo

598-622   2º episódio

623-80   2º estásimo

681-851   3º episódio

852-907   3º estásimo

908-1078   Êxodo

 

Manuscritos, edições, traduções

A fonte mais importante da tragédia é o manuscrito Laurentianus 32.9 (Mediceus), do século X, conservado atualmente na Biblioteca Laurenciana de Florença.

A hypóthesis que antecede o texto trágico tem cerca de 15 linhas e é uma das mais informativas de que dispomos; a ela devemos os dados sobre a tetralogia, a premiação, a data, o cenário e personagens do drama. Eis a passagem sobre a tetralogia e a data:

ἐπὶ Μένωνος τραγωιδῶν Αἰσχύλος ἐνίκα Φινεῖ, Πέρσαι, Γλαύκωι Ποτνιεῖ, Προμηθεῖ. Quando Menon (era arconte), Ésquilo venceu o concurso de tragédias com Fineu, Persas, Glauco de Potnias e Prometeu.

Passagens selecionadas

A editio princeps foi a Aldina, de 1518, preparada por Franciscus Asulanus (Francesco Torresano). A primeira tradução latina é, aparentemente, a de Ioannes Saravius, publicada por Ioannes Oporinus em 1555.

As edições modernas isoladas mais importantes são as de Henry Broadhead (1960), Jacqueline de Romilly (1974), Luigi Belloni (1988), Martin West (1991, 21998), Edith Hall (1996, 22007) e Alexander Garvie (2009).

Ver também a tradução geral das tragédias

As primeiras traduções para o português foram as de Urbano Tavares Rodrigues (1984) e de Manuel de Oliveira Pulquério (1992), em Portugal. No Brasil, a tradução de Junito Brandão é anterior a 1995, mas só foi publicada em 2013. Mário G. Kury publicou a sua em 1992; JAA Torrano, isoladamente, em 2002; Trajano Vieira, em 2013; Ricardo Nogueira, 2017.

Recepção

Frínico e As Fenícias

Segundo o escoliasta de Aristófanes Rãs 1028, que evocou a autoridade de Eratóstenes, a tragédia foi reapresentada em Siracusa, a pedido do tirano Hierão I (fl. -478/-467), anos depois do concurso ateniense.

Durante o Período Bizantino, Persas foi uma das tragédias mais lidas e mais copiadas, e fazia parte da “tríade bizantina” das tragédias de Ésquilo.

A primeira reapresentação da tragédia depois da Antiguidade data de 1571, em Zacinto, nas Ilhas Jônicas, provavelmente em versão italiana (APGRD).

No Brasil, a tragédia foi representada em 1961 (São Paulo, Teatro TAIB, direção de Alfredo Mesquita), em 1994 (Sesc Pompeia, direção de Theodorus Terzopoulos), em 2012 e em 2013 (Club Noir, direção de Roberto Alvim, com Juliana Galdino, Renato Forner e outros).