mitologia840 palavras

Gaia e Urano, a terra e o céu

ὡς οὐρανός τε γαῖά τ' ἦν μορφὴ μία·
ἐπεὶ δ' ἐχωρίσθησαν ἀλλήλων δίχα,
τίκτουσὶ πάντα κἀνέδωκαν εἰς φάος,
δένδρη, πετεὶνά, θῆρας οὕς θ' ἅλμη τρέφεὶ
γένος τε θνητῶν.

O céu a terra eram uma só forma;
e quando se separaram um do outro, em dois,
criaram todas as coisas e levaram-nas à luz:
árvores, aves, animais, seres que o mar alimenta
e a raça dos mortais.

Céu noturnoCéu noturno

Na teogonia hesiódica, Urano (gr. Οὐρανός) é a personificação do céu estrelado; emergiu ou se desprendeu de Gaia de modo assexuado e imediatamente a recobriu em toda a sua extensão, tornando-se seu consorte.

A partir dessa união entre o céu e a terra (sc. Urano + Gaia) o mundo começou, efetivamente, a tomar forma e nesse ponto a mitologia grega concorda com outras tradições antigas[1].

O domínio de Urano

Urano foi a primeira divindade a assumir o controle do universo. No início, gerou divindades poderosas, selvagens e incontroláveis, que obedeciam apenas sua própria natureza: os ciclopes e os hecatônquiros. i0659

Os ciclopes (gr. κύκλωπες) eram três gigantes com um único olho no meio da testa e grande habilidade manual: Brontes, o trovão; Estérope, o relâmpago; e Arges, o raio[2].

Os hecatônquiros (gr. ἑκατόγχειρες) também eram três, igualmente gigantescos, poderosos e dotados de cem braços e cinquenta cabeças: Coto, Briaréu e Gigues.

Os hecatônquiros e ciclopes participam, basicamente, da titanomaquia; um dos hecatônquiros, Briaréu, ajudou Zeus durante a revolta dos deuses olímpicos.

Mais tarde ou até antes, segundo Hesíodo (Th. 132-3), Urano e Gaia geraram os titãs.

Os titãs (gr. Τῑτᾶνες), eram um pouco menos selvagens do que os irmãos, mas igualmente poderosos: Oceano, Ceos, Crios, Hipérion, Jápeto e Crono. E suas irmãs, as titânides (gr. Τῑτανίδες), eram Reia, Teia, Febe, Têmis, Mnemósine e Tétis.

A linhagem dos titãs e titânides foi a mais produtiva e é a mais importante das duas, pois foi um dos titãs, Crono, que iria destituir o pai e assumiria posteriormente o controle do Universo.

Os titãs Crono e Reia deram origem aos deuses olímpicos; seus primos, filhos dos outros titãs, eram também divindades poderosas, mas de menor importância mitológica.

O pai desnaturado

Urano detestou todos os filhos desde o começo (Hes. Th. 155-6); provavelmente, também os temia. À medida que nasciam, mantinha-os sob a terra, não os deixava ver a luz, e se “deliciava com essa obra maligna” (Hes. Th. 158). Assim, após um começo enérgico, a formação do mundo havia chegado a um impasse: o potente Urano, embora tivesse gerado novas e poderosas divindades, não permitia que deixassem o interior de Gaia.

Titãs, ciclopes e hecatônquiros, presos no interior da mãe, temiam o pai e nada faziam. Gaia, porém, incomodada com a potência inútil de Urano, atulhada e ofendida, começou a conspirar contra o próprio marido.

A destituição de Urano

miniaturaA castração de Urano

Um belo dia, a mãe de todos finalmente se cansou das loucuras de Urano e urdiu um astucioso plano para libertar os filhos e ao mesmo tempo se livrar do incômodo vigor do marido. Criou, em suas entranhas, o ferro mais resistente, fez com ele uma afiada foice e pediu ajuda aos filhos. Somente Crono (gr. Κρόνος), o mais novo, de “pensamentos tortuosos” (Hes. Th. 168), que odiava o pai e não o temia, concordou em ajudá-la.

Armado da foice, Crono se escondeu e à noite, quando Urano recobriu Gaia, decepou com um só golpe os genitais do pai e lançou-os no mar. Libertou, a seguir, todos os irmãos presos no interior da terra.

Os últimos descendentes

Urano continuou a cobrir Gaia diariamente, mas sem tocá-la: privado da capacidade geradora direta, aposentou-se e não procriou novamente.

Mas Urano era tão fértil que, mesmo sem os genitais, foi capaz de gerar outros descendentes. O esperma que caiu no mar, perto da ilha de Chipre, produziu uma espécie de espuma de onde emergu a deusa Afrodite. O sangue da ferida, ao cair sobre a terra, gerou as ninfas melíades, as erínias e, posteriormente, os gigantes.

Afrodite é uma das divindades mais importantes do panteão grego. As erínias participam diretamente da lenda de Orestes e da lenda de Alcmeon, filho de Anfiarau. Os gigantes desafiaram os deuses olímpicos na gigantomaquia.

Iconografia e culto

Urano, Ciclopes e Hecatônquiros não eram objeto de culto, nem habitualmente representados em obras de arte. Para as melíades, ver sinopse sobre as ninfas; para os gigantes, ver a sinopse correspondente.