introdução435 palavras

Entrevista com JAA Torrano

Adriane Duarte, Fernando Brandão, eu, JAA TorranoAdriane Duarte, Fernando Brandão, eu, JAA Torrano

José Antonio Alves (JAA) Torrano é professor titular de língua e literatura grega da USP e um dos mais prolíficos tradutores de textos gregos em atividade.

Já publicou, além dos poemas épicos Teogonia e Escudo de Héracles, de Hesíodo, cuidadosas traduções de todas as tragédias de Ésquilo, de Sófocles e de Eurípides, além de alguns poemas de Safo de Lesbos.

Em 16 de janeiro de 2005, por ocasião do lançamento da sua tradução da Oresteia, Torrano concedeu uma entrevista ao repórter Caio Liudvik, da Folha de São Paulo, da qual extraí dois trechos significativos:

Mito

P: O que o sr. entende por mito?

R: Para mim, o mito é uma forma de linguagem. Quando uso a palavra "mito", estou me referindo ao mito grego, e estou pensando na concepção grega arcaica de linguagem como uma forma divina do mundo, que é pensada com as imagens e a representação das musas. A linguagem interpela o homem através das aparências do mundo. Essa concepção de linguagem, e a atitude do homem determinada por essa concepção, é o que chamo de pensamento mítico.

Ésquilo, cultura clássica e atualidade

P: O que o leitor de hoje pode aprender com a “Oresteia”, que o senhor designa como paradigma da tragédia grega?

R: Penso que a identificação pura e simples é o caminho do equívoco. A atualidade de Ésquilo é que ele é referência de um passado longínquo, e o futuro, como já disse o filósofo, se abre para nós a partir do passado. Trata-se, sem dúvida, de uma referência de algo que ultrapassa as limitações do presente, a penúria do presente, a imersão no imediatismo do presente com o que isso tem de cegueira e obtusidade.

Essa consciência histórica — ter uma referência longínqua e externa — é um alongamento da perspectiva, um exercício da acuidade do olhar, algo que nos mostra o outro e que permite, por contraste, revelar a nossa própria identidade e examinar o futuro, vendo-nos a nós mesmos com um olhar crítico.

Os jovens que têm cultura clássica estão menos sujeitos a se deixarem escravizar por seitas limitadoras, por religiões aprisionadoras. Eles têm uma liberdade espiritual trazida pela consciência de que a cultura tem sua história, seu desenvolvimento, sua diversidade. Há outros parâmetros com que o presente pode ser confrontado, examinado, perscrutado, investigado. O valor atemporal [desta obra] está ligada a seu valor histórico e, se já não tivesse valor histórico, não teria mais valor nenhum.