Platão / Banquete 185c-186e

Pl. Smp. 185c-186e -387 / -367
tradução / grego antigo

A passagem mostra uma das intervenções do médico ateniense Erixímaco nas discussões, na qual discorre sobre a "teoria dos opostos" e dá uma receita prática para o soluço.

A tradução é do Prof. J. Cavalcante de Souza (1966).

Uma receita prática

185c (...) Disse Aristodemo que devia falar Aristófanes, mas tendo-lhe ocorrido, por empanturramento ou algum outro motivo, um acesso de soluço, não podia ele falar; mas disse ao médico Erixímaco, que se reclinava logo abaixo dele: "Ó Erixímaco, és indicado para ou fazer parar o meu soluço ou falar em meu lugar, até que eu o possa parar."

E Erixímaco respondeu-lhe: "Farei as duas coisas: falarei em teu lugar e tu, quando acabares com isso, no meu. E enquanto eu estiver falando, vejamos se, retendo tu o fôlego por muito tempo, quer parar o teu soluço; senão, gargareja com água. Se no entanto ele é muito forte, toma algo com que possas coçar o nariz e espirra; se fizeres isso duas ou três vezes, por mais forte que seja, ele cessará (...)

186a Com efeito, quanto a ser duplo o Amor, parece-me que foi uma bela distinção; que porém não está ele apenas nas almas dos homens, e com os belos jovens, mas também nas outras partes, e com muitos outros objetos, nos corpos de todos os outros animais, nas plantas da Terra e por assim dizer em todos os seres, é o que creio ter constatado pela prática da medicina, a nossa arte (...)

Ora, eu começarei pela medicina a minha fala, afim de que também homenageemos a arte. A natureza dos corpos, com efeito, comporta esse duplo amor; o sadio e o mórbido são cada um reconhecidamente um estado diverso e dessemelhante, e o dessemelhante deseja e ama o dessemelhante (...)"

É de fato preciso ser capaz de fazer que os elementos mais hostis no corpo fiquem amigos e se amem mutuamente. Ora, os mais hostis são os mais opostos, como o frio ao quente, o amargo ao doce, o seco ao úmido, e todas as coisas desse tipo; foi por ter entre elas suscitado amor e concórdia que o nosso ancestral Asclépio, como dizem estes poetas aqui, e eu acredito, constituiu a nossa arte (...)